O torniquete (TQ) representa uma das mais importantes estratégias para a salvaguarda de vidas humanas nos mais variados ambientes.
Pode definir-se como qualquer dispositivo destinado a parar uma hemorragia em área anatómica que o permita.
Tanto no mundo civil como em ambiente militar de combate, a hemorragia traumática é a maior causa de morte prevenível, até 30% e 90% respectivamente.
A iniciativa “Tactical Combat Casualty Care” (TCCC), uma bem-sucedida tentativa de reunir a melhor evidência científica disponível e prática clínica estado da arte, adaptando-as para o combate onde as particulares logísticas e de pessoal não permitem o nível de cuidados de que dispomos normalmente, permitiu abordar, entre outras lesões, o flagelo que a hemorragia exsanguinante representa.
Na Guerra do Vietname, até 9% das mortes americanas em combate deveram-se a hemorragias exsanguinante nas extremidades (vulgo membros).
Enquanto lesão possivelmente fatal, se não abordada corretamente, a hemorragia exsanguinante ou massiva deve ser sempre o primeiro aspecto a tratar. Para isso, no caso das hemorragias das extremidades, o TQ representa uma ferramenta imprescindível. Características como o seu tamanho, peso, facilidade de uso e eficácia se usado correctamente tornam-no indispensável em qualquer bolsa individual de emergência médica.
Do seu uso disseminado a partir de 2005 observou-se um decréscimo superior a 67% nas mortes por hemorragia, uma vez que nas operações “Enduring Freedom” e “Iraqi Freedom” se estima que tenham totalizado 2.6%. Na presença de lesão exsanguinante de um membro, a correcta utilização de um TQ pode representar um incremento de 90% na probabilidade de sobreviver.
Pelo exposto, hoje em dia todos os militares aliados levam consigo um TQ quando destacados em cenários hostis, bem como em treino. Também é comum o seu uso por agências de segurança, mais disseminado no estrangeiro, onde grande parte dos polícias o transportam dada a elevada incidência de ocorrências com armas de fogo e armas brancas que resultam não várias vezes em lesões graves, e por vezes mortes. Existe mesmo uma estratégia desenvolvida que procura, à semelhança do TCCC, salvar vidas em incidentes táctico-policias, o “Tactical Emergency Casualty Care” (TECC) cujas normais são hoje em dia adoptadas mundialmente.
Em Portugal, apenas unidades mais especializadas terão ao dispor esta ferramenta, pelo grau de ameaça que enfrentam.
Também as equipas de emergência pré-hospital pelo mundo fora dispõem do TQ para salvar vidas.
Em meio hospitalar também é viável o seu uso, e está disponível, nomeadamente, nas salas de emergência e cirurgia de muitos hospitais e mesmo centros de saúde.
Mas a utilidade do TQ não se fica apenas pelos militares, polícias e profissionais de emergência médica. Também nas mais diversas actividades profissionais, desportivas ou radicais pode o TQ revelar-se útil.
Desde o pouco provável incidente táctico-policial, cujos relatos frequentes no estrangeiro nos vão chegando de atentados terroristas e tiroteios, ao acidente de trabalho grave, até os acidentes de viação ou mesmos lesões condicionadas pela fauna, são várias as circunstâncias em que um TQ bem aplicado pode salvar uma vida, permitindo tempo precioso até à chegada de meios diferenciados de socorro.
Então, quais as lesões elegíveis para o uso do TQ?
As hemorragias massivas ou exsanguinantes, que representam perigo de vida. Tais lesões podem condicionar a morte em tão pouco como 3 minutos.
É possível reconhecê-las quando:
- Há uma poça de sangue vermelho vivo no chão junto da vítima;
- A roupa está encharcada de sangue;
- Há um fluxo pulsátil ou contínuo importante de sangue da ferida;
- Compressas ou toalhas improvisadas para exercer pressão sobre a ferida são ineficazes e ficam encharcadas de sangue;
- Há uma amputação de um membro.
Como utilizar um TQ?
- Identificada a lesão sangrante definida acima, se possível e nunca se colocando em risco, aplicar pressão directa sobre a mesma, enquanto prepara o TQ. A utilização de uma mão apenas ou de ambas deve ser treinada, uma vez que o próprio pode respectivamente, ter uma lesão num dos braços/antebraços ou nos membros inferiores ou ainda estar a providenciar socorro a outra pessoa.
- Colocar o TQ, de preferência directamente na pele, 5 a 8 centímetro (um palmo) acima da lesão, mas nunca numa articulação.
- Se não for possível vislumbrar o sítio da hemorragia colocar o torniquete junto à raiz do membro (axila, virilha).
- Se for usado um TQ comercial, este deve ser ajustado ao perímetro do membro, após ser colocado no local da aplicação, antes de apertado.
- Um TQ bem aplicado significa que a hemorragia parou e que o pulso não é palpável a jusante.
- Se um TQ não for eficaz pode ser colocado outro lado-a-lado
- Enquanto é aplicado o TQ pedir a alguém para chamar ajuda diferenciada ou chamá-la assim que controlada a hemorragia. Nunca atrasar desnecessariamente o pedido de auxílio!
Diferentes torniquetes
Podemos classificar os torniquetes em comerciais e improvisados.
Dentro do primeiro grupo temos os torniquetes para uso tático e/ou emergência médica que, regra geral são mais rápidos e seguros mas também maiores (CAT7®, SOFTT-W®, SAM-XT®, X8T® e TMT®, p.e) e aqueles desenhados para serem mais compactos permitindo serem mais facilmente transportados no dia-a-dia (RATS® e Tourni-Key®, p.e).
Dentro dos improvisados temos virtualmente qualquer dispositivo composto por uma banda de tecido não elástico (gravata, p.e) e um sistema de aperto, geralmente um objeto longo e resistente em madeira, metal ou plástico que, através de movimentos rotativos sob o laço têxtil o vai apertando. Deve haver a preocupação de não usar bandas demasiado finas que potenciam a lesão às estruturas vasculares e nervosas que constringe, bem como a de impedir que o TQ alargue.
Não obstante o TQ ser um importante instrumento que pode significar uma vida salva, o utilizador não deve nunca colocar-se a si ou outros em perigo na tentativa de providenciar socorro.
Uma ferramenta só útil quando acompanhada de treino para usá-la.

